terça-feira, 10 de novembro de 2009

RELATÓRIO PAULO COUTO/CINE TEATRO

Relatório apresentado pelo arquiteto Paulo Couto acerca do piso do Cine-Teatro Oeiras

O Cine Teatro Oeiras foi incluído no Perfil do Projeto do Programa Monumenta, inicialmente, como Imóvel Público Destacado, com investimentos restritos apenas a restauração de suas fachadas e sua cobertura. No entanto devido a pedidos da população e ao estado de degradação interna do prédio, ficou decidido, após uma reunião, em junho de 2003, na sede do programa em Brasília entre a UEP/Oeiras (Unidade Executora do Projeto) e a UCG (Unidade Central de Gerenciamento), que ele passaria a ser tratado como Monumento para que pudesse receber investimentos necessários para a reforma de seu interior. (Ajuda Memória em anexo)











O projeto arquitetônico executivo de restauração do Cine Teatro Oeiras foi elaborado por mim, Paulo de Tarso Gonçalves Couto - Especialista em Patrimônio da UEP/Oeiras, com a colaboração de uma arquiteta contratada pelo IPHAN/PI, a pedido dessa UEP. Gostaria de abrir, agora, um parêntesis e esclarecer que sou arquiteto formado pela Escola de Arquitetura da UFMG e especializado em Restauração de Bens Imóveis pela Escola de Restauração do Instituto Nacional de Antropologia e História do México - INAHM. Participei como Consultor Técnico Especializado, da restauração da Igreja de São Benedito e do Museu do Piauí em Teresina, do projeto de Revitalização da área da Estação Ferroviária de Parnaíba e elaborei o projeto arquitetônico de restauração do antigo Quartel da Polícia Militar do Piauí, em Teresina, adaptando-o ao seu uso atual: Central de Artesanato alem de ter restaurado algumas residências particulares, de valor estético e patrimonial de nossa cidade. A citada arquiteta que colaborou com o projeto, elaborou um minucioso cadastro, seguido de diagnóstico de alguns elementos do prédio e de propostas de recuperação dos mesmos, através de detalhamentos anexados ao projeto e ao seu memorial descritivo. Para ser mais preciso tal detalhamento constou de fotos (com diagnósticos e propostas) e desenhos gráficos das propostas de restauração de suas esquadrias. Os demais detalhamentos e especificações foram elaborados por mim. O projeto passou por inúmeras análises técnicas na UCG, em Brasília, até que fosse aprovado. Acontece que entre o final da elaboração do projeto e a execução das obras de recuperação do Cine Teatro, passaram-se quase cinco anos, com o prédio em estado de abandono, degradando-se mais ainda nesse período. Foi o caso do piso do foyer, da platéia, dos camarins e de sua circulação. Trata-se de um mosaico, com desenhos geométricos em preto e branco, muito adequado ao estilo art decó do prédio, além de ser original em sua maioria. No memorial descritivo está especificada, por mim, sua recuperação, mas, como já foi mencionado, o tempo entre o projeto e a obra deixou-o em um estado lamentável tornando-se impraticável sua recuperação, principalmente na sua platéia que é a maior área.



Durante uma visita de fiscalização às obras, evidenciei, in loco, para a chefe da Divisão Técnica do IPHAN/ PI também presente à citada fiscalização, o estado de degradação do piso e sugeri que o melhor seria substituí-lo por carpete na platéia, mantendo e recuperando o mesmo no foyer, nos camarins e sua circulação, por estarem em melhor estado de conservação e, assim, caracterizando sua existência no prédio. A solução do carpete melhoraria, também, a acústica da platéia que, por ser retangular, não possui uma boa acústica e, no projeto, como solução de melhoramento acústico eu já havia especificado, também, o revestimento com carpete nas paredes da mesma, além de ter trabalhado seu forro de maneira apropriada para tal. A minha sugestão foi acatada por ela. Convêm ressaltar que a UEP/Oeiras, visando atender as normas de segurança contra incêndio, recomendou a Empresa Construtora a usar o carpete anti chamas. Em seguida o IPHAN/PI contratou a mesma arquiteta que colaborou com o projeto executivo, para fiscalizar a obra e, em uma visita de fiscalização, ela constatou a mudança nas especificações, quanto ao piso da platéia, discordando frontalmente dessa solução, o que fez a chefe da Divisão Técnica do IPHAN/PI voltar atrás e resolver manter o que estava especificado no projeto, apesar de tal resolução já constar no diário de obra da Empresa Construtora (em anexo). Alegou que opiniões podem ser mudadas... O resultado foi desastroso. Ficou evidente a diferença entre o mosaico substituído e o existente, causando um péssimo efeito estético. Por esse motivo a UEP/Oeiras enviou ao IPHAN/PI, no dia 29 de setembro de 2009, um ofício (nº 070/2009, em anexo) manifestando sua preocupação quanto ao fato e solicitando, desse órgão, um posicionamento quanto à manutenção, limpeza ou substituição das peças danificadas que permaneceram na platéia do Cine Teatro







Devido a esse e outros problemas, relacionados à fiscalização da obra, foi realizada na SEINFRA, no dia 30 de setembro de 2009, uma reunião com a presença do Secretário do órgão, da Presidente da FUNDAC e seus técnicos da área, alem dos técnicos da UEP/Oeiras, do IPHAN/PI e da Empresa Construtora, para que o citado órgão federal esclarecesse as contradições de sua fiscalização. Após explanações, discordei da chefe da Divisão Técnica do IPHAN/PI, quando insistiu na manutenção do piso existente na platéia do Cine Teatro, alegando ser preferível manter a autenticidade do imóvel em detrimento da estética. Tal alegação soa no mínimo curiosa, pois um bom profissional em arquitetura, mesmo no âmbito da restauração, tem um compromisso com a estética sim e a solução concordada anteriormente, sobre a substituição do piso existente por carpete, não agride, em hipótese alguma, a autenticidade do prédio; aliás, esse tipo de solução é usual na recuperação de inúmeras salas de espetáculo espalhadas pelo mundo. Ao final da reunião a determinação do IPHAN/PI, foi acatada pelo titular da SEINFRA, em detrimento dos argumentos da UEP/Oeiras.







Somente no dia 05 de outubro de 2009 a UEP/Oeiras recebeu um ofício do IPHAN/PI (nº 494/2009/IPHAN/PI, em anexo) em resposta ao Ofício UEP/070/2009 encaminhando a sua posição quanto ao piso do Cine Teatro, por meio de uma Informação Técnica assinada pela chefe de sua Divisão Técnica. Tal informação diz ter orientado, juntamente com a arquiteta contratada para fiscalização, o responsável pela obra a manter algumas peças do mosaico, apesar de seu desgaste, alegando que, por causa do bom assentamento das mesmas, a retirada das peças desgastadas poderia danificar as demais a serem preservadas, afirmando que elas ainda exercem sua função na edificação (???). Acrescenta, também, que o piso existente é composto de peças colocadas na última intervenção do imóvel, nos anos 90 do século passado, e de outras, provavelmente, da época de sua construção, esquecendo-se que a palavra “provavelmente” levanta uma dúvida e, segundo o arquiteto restaurador mexicano Carlos Chanfon, que foi diretor do Curso de Restauração do Instituto Nacional de Antropologia e História do México, na década de 1970: “Quando começa a dúvida termina a Restauração”, portanto é preferível encontrar uma solução que se aproxime do contemporâneo, sem comprometer a integridade do bem. Por fim esclarece que estavam presentes, na vistoria, o arquiteto especialista em patrimônio da UEP/Oeiras (eu) e o fiscal da SEINFRA, como se esse fato significasse a concordância, de minha parte, sobre sua orientação, o que não é verdade.







Reconheço, com lucidez, que o IPHAN é um órgão que procura exercer bem a sua competência e que está corretíssimo quando diz que fiscaliza uma obra visando a qualidade dos serviços executados. Porém um profissional bem qualificado, em qualquer área, é capaz de conferir eficiência ao trabalho, dominando o conteúdo de seu metier, conseguindo passá-lo adiante de maneira clara e simples, sem afetação. Quanto à fiscalização das obras do Cine Teatro Oeiras por parte do IPHAN/PI (a 19ª Superintendência), acredito que esse órgão deveria entender o básico - seus técnicos, nesse caso, devem ser treinados para fiscalizar e não difundir teorias pedagógicas genéricas, algumas vezes anacrônicas, de uma maneira radical sem aceitar argumentos. O que fica claro, nesse cenário, é a difusão, por parte deles, de um valor diferente: o de que todo profissional deve ser apenas um bom teórico. E o pior é que eles se tornam defensores de teorias sem saber se funcionam na vida pratica, pois, ao que se consta, não é conhecida, até agora, nenhuma obra realizada através de um projeto elaborado por algum técnico dessa superintendência do IPHAN. Na reunião do dia 30 de setembro causou no mínimo curiosidade a citação, por parte de uma técnica desse órgão, da “Carta de Veneza” e apenas de seu título, sem mencionar nada de seu conteúdo, deixando os presentes sem saber se ela queria apenas mostrar “sapiência”, ou impressioná-los, haja visto que, com a exceção de alguns técnicos da área patrimonial ali constantes, muitos desconheciam a existência de tal documento. Isso denota claramente o propósito dos técnicos do IPHAN/PI em demonstrar uma “superioridade” afetada e desnecessária.







Por fim, gostaria de acrescentar que, em algumas obras de restauração já concluídas pelo Programa Monumenta em Oeiras, intervenções, até mais radicais, foram feitas sem que a fiscalização do IPHAN/PI apresentasse alguma objeção. Foi o caso da pintura do prédio do Café Oeiras, onde foram usados alguns tons de verde bastante forte, passando despercebido pela fiscalização desse órgão, se visto pelos critérios usados na fiscalização do Cine Teatro. No Sobrado Major Selemérico o piso usado, na sua restauração, foi uma cerâmica Gail bem contemporânea, inclusive, recomendada pela Divisão Técnica do IPHAN/PI, aliás, cerâmica essa também usada, por esse órgão, no piso da Igreja de Nossa Senhora da Vitória (imóvel com Tombamento Federal) quando de sua restauração, por parte do mesmo, realizada entre os anos de 2003 e 2004. Essa igreja teve, também, suas telhas totalmente substituídas por novas em cerâmica do tipo colonial paulista, ficando a pergunta: será que as anteriores não cumpriam mais sua função???







Apenas mais uma observação: A igreja de Nossa Senhora da Vitória estava incluída, como monumento, no Perfil do Projeto Oeiras do Programa Monumenta, porém foi restaurada, antecipadamente, pelo IPHAN, que nessa época possuía apenas uma delegacia no Piauí. Seu projeto de restauração foi elaborado por um profissional de São Luiz/MA.







Teresina, 14 de outubro de 2009.



Paulo de Tarso Gonçalves Couto



Especialista em Patrimônio da UEP/Oeiras








Nenhum comentário:

Postar um comentário